Presunção de inexequibilidade na Nova Lei de Licitações e Contratos (14.133/21)

A nova lei de licitações, ofertada como uma redação contemporânea da realidade da administração pública no que se refere a contratações públicas, traz exaustiva prevenção em resguardar a boa execução contratual, considerando não apenas o menor preço apresentado, mas, o realce de que as contratações devem observar objetivos finalísticos, voltados ao cuidado antecipado ao enlace contratual, vejamos:

Art. 11. O processo licitatório tem por objetivos:

I – assegurar a seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a Administração Pública, inclusive no que se refere ao ciclo de vida do objeto;

II – assegurar tratamento isonômico entre os licitantes, bem como a justa competição;

III – evitar contratações com sobrepreço ou com preços manifestamente inexequíveis e superfaturamento na execução dos contratos;

IV – incentivar a inovação e o desenvolvimento nacional sustentável.

O Art. 59 do mesmo diploma legal, por sua vez, registra o seguinte texto:

Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:

I – contiverem vícios insanáveis;

II – não obedecerem às especificações técnicas pormenorizadas no edital;

III – apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento  estimado para a contratação;

IV – não tiverem sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela Administração;

V – apresentarem desconformidade com quaisquer outras exigências do edital, desde que insanável.

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Observem, que a redação legal, considera de forma nítida a “inexequibilidade” como mero indício,cabendo (ao meu ver) existir redação própria sobre o tema no instrumento convocatório, de forma a definir critérios objetivos e pacificar o tema, evitando questionamentos no transcursar de um certame licitatório.

Outrossim, cabe ao agente responsável pela condução, identificar preços inferiores com base em critérios editalícios e diligenciar junto a empresa, oportunizando o ofertante de demonstrar a exequibilidade da proposta apresentada, conforme estatui a SÚMULA TCU 262, in verbis:

SÚMULA TCU 262: O critério definido no art. 48, inciso II, § 1º, alíneas “a” e “b”, da Lei 8.666/1993 conduz a uma presunção relativa de inexequibilidade de preços, devendo a Administração dar à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta.

Imperioso trazer à baila, que uma vez registrado em edital de forma objetiva, estes critérios passam a ser de conhecimento do licitante – que tem o dever de observar minuciosamente seus termos para eventual impugnação dos regulamentos ali registrados – e sua participação sem prévia impugnação dos termos, opera-se de preclusão quando se discute matéria que deveria ser tratada em fase anterior, importando assim em sua concordância com os termos editalícios.

O STJ, esclarece que a presunção de inexequibilidade deve ser relativa, oportunizando ao licitante à demonstração de exequibilidade da proposta, senão vejamos:

“RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. PROPOSTA INEXEQUÍVEL. ART. 48, I E II, § 1º, DA LEI 8.666/93. PRESUNÇÃO RELATIVA. POSSIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO PELO LICITANTE DA EXEQUIBILIDADE DA PROPOSTA.    RECURSO    DESPROVIDO.    

1.    A    questão controvertida consiste em saber se o não atendimento dos critérios objetivos previstos no art. 48, I e II, § 1º, a e b, da Lei 8.666/93 para fins de análise do caráter exequível/inexequível da proposta apresentada em procedimento licitatório gera presunção absoluta ou relativa de inexequibilidade. 2. A licitação visa a selecionar a proposta mais vantajosa à Administração Pública, de maneira que a inexequibilidade prevista no mencionado art. 48 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos não pode ser avaliada de forma absoluta e rígida. Ao contrário, deve ser examinada em cada caso, averiguando-se se a proposta apresentada, embora enquadrada em alguma das hipóteses de inexequibilidade, pode ser, concretamente, executada pelo proponente. Destarte, a presunção de inexequibilidade deve ser considerada relativa, podendo ser afastada, por meio da demonstração, pelo licitante que apresenta a proposta, de que esta é de valor reduzido, mas exequível. 3. Nesse contexto, a proposta inferior a 70% do valor orçado pela Administração Pública (art. 48, § 1º, b, da Lei 8.666/93) pode ser considerada exequível, se houver comprovação de que o proponente pode realizar o objeto da licitação. […] a vencedora do certame “demonstrou que seu preço não é deficitário (o preço ofertado cobre o seu custo), tendo inclusive comprovado uma margem de lucratividade”. […] (STJ – REsp: 965839 SP 2007/0152265-0, Relator: MinistraDENISE ARRUDA, Data de Julgamento: 15/12/2009, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/02/2010).” (Grifo nosso)

Na mesma linha, a Ilustre Ministra Denise Arruda complementa em outro processo:

(…)

consoante dispõe o art. 41 da Lei 8.666/93, a Administração encontra-se estritamente vinculada ao edital de licitação, não podendo descumprir as normas e condições deles constantes. É o instrumento convocatório que dá validade aos atos administrativos praticados no curso da licitação, de modo que o descumprimento às suas regras deverá ser reprimido. Não pode a Administração ignorar tais regras sob o argumento de que seriam viciadas ou inadequadas. Caso assim entenda, deverá refazer o edital, com o reinício do procedimento licitatório, jamais ignorá-las.” (MS n° 13.005/DF, 1° S, Rel. Min. Denise Arruda, J. em 10/10/2007, DJe 17/11/2008)

Por desdobramento, tem-se que o principal objetivo da Administração é evitar o descumprimento do contrato e a descontinuidade do serviço, mas é bem verdade que não há um limite legal que obrigue o particular a praticar preços específicos na planilha de custos, uma vez que a Administração não tem a prerrogativa de vincular os licitantes de modo que impeça a livre concorrência.

Importante salientar, que o agente não deve interpretar de forma imediata a inexequibilidade da proposta, mas sim, presumir que ali pode estar diante de valores impraticáveis e por conseguinte de uma possível e futura inexecução contratual, trata-se de uma “presunção de inexequibilidade” que somente após oportunizado ao ofertante, poderá ser avaliado com exatidão pelo responsável pela condução do certame, sob pena de responsabilização.

Com esse raciocínio, isto é, de que uma proposta não pode ser  desclassificada por preço inexequível quando o licitante comprovar que a cumprirá integralmente, é que se confirma o caráter relativo do art. 59 da Lei 14.133/2021.